"To Rome With Love": Woody Allen e a crítica ao mundo das artes

Cena de "To Rome With Love" passada na ópera.
A FORMA TÍPICA em que Woody Allen elabora os seus filmes, partindo de pressupostos fantasiosos e, no mínimo, inverosímeis, é algo que não consegue envolver o P.Z. completamente nos filmes desse realizador; as idiossincrasias de Allen também têm sempre o mesmo padrão, tão linearmente definido que se torna previsível. Foi sobretudo a curiosidade em relação ao “quão previsível?” que guiou o P.Z. até ao filme “To Rome With Love”: sem dúvida, mais um filme de Allen, desajeitadamente (ou estilisticamente?) focado na crítica social de uma população seleccionada. Algumas cenas relacionadas com ópera—tema bem conhecido na obra do realizador americano ao som de Caruso em “Match Point—foram particularmente interessantes aos olhos do P.Z.

Jerry (Woody Allen) é um encenador de ópera reformado cujo trabalho não foi reconhecido, lamentando ainda não ter atingido "aquilo que realmente queria". Está convencido de que a razão dessa insatisfação é o facto de o público não ter compreendido a sua posição avant-garde. Numa conversa de família, dizem-lhe que o problema era “estar demasiado à frente do seu tempo”, ao que Jerry prontamente responde “I was way ahead of my time!”. Segue a expressão americana porque o P.Z., por enquanto, não se lembra de uma portuguesa que consiga exprimir a convicção do artista na genialidade da sua obra.

Ironicamente, mais tarde se revela que as concepções geniais eram um “Rigoletto com todas as personagens vestidas de ratos brancos” e uma “Tosca inteiramente passada numa cabine telefónica”—ideias que decerto deixam os leitores todos babados! (O que será que esse “Rigoletto” recorda ao P.Z.?) Será o momento adequado de notar que, na verdade, o artista só se sente realizado quando a sua obra é reconhecida pelo público: daí que Allen tenha enfatizado a obsessão de Jerry com a sua reforma (a morte artística). Trata-se esta ironia de uma contundente crítica aos pseudo-artistas que insistem em dar a conhecer a sua arte independentemente da sua qualidade, pelo caminho tornando-se sanguessugas de subsídios às artes dados pelo Estado, culpando o público pelo não reconhecimento da sua obra. Com esta breve análise meramente interpretativa do filme de Woody Allen, está concluído um post dedicado aos falsos artistas: até agora, uma falta neste blog. Allen sabia certamente o que fazia, já que ele próprio encenou recentemente o Gianni Schicchi” da Ópera de Los Angeles (a convite de Plácido Domingo) e falou ao “Corriere della Seraacerca de encenações de ópera.

Já que se começou com este filme, será interessante referir a parte da história que se reporta a Giancarlo, um italiano perfeitamente normal, mas com uma admirável voz de tenor que se recusa a exibir fora do duche. O papel é representado pelo tenor Fabio Armiliato—um excelente cantor lírico na vida real—criticando a imensidão de vozes que poderiam brilhar se resolvessem mostrar-se. Claro que—não fôsse o filme de Woody Allen—Armiliato acaba por aparecer como Canio na Ópera de Roma… enquanto toma duche! O resto do filme está divido em várias histórias que não têm lugar neste blog, pelo que o leitor está convidado a ver “To Rome With Love” com uma nova perspectiva.

Pagliacci com duche.

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