Cena de "To Rome With Love" passada na ópera. |
Jerry (Woody Allen) é um encenador de ópera reformado cujo trabalho não foi reconhecido, lamentando ainda não ter atingido "aquilo que realmente queria". Está convencido de que a razão dessa insatisfação é o facto de o público não ter compreendido a sua posição avant-garde. Numa conversa de família, dizem-lhe que o problema era “estar demasiado à frente do seu tempo”, ao que Jerry prontamente responde “I was way ahead of my time!”. Segue a expressão americana porque o P.Z., por enquanto, não se lembra de uma portuguesa que consiga exprimir a convicção do artista na genialidade da sua obra.
Ironicamente, mais tarde se revela que as concepções geniais eram um “Rigoletto com todas as personagens vestidas de ratos brancos” e uma “Tosca inteiramente passada numa cabine telefónica”—ideias que decerto deixam os leitores todos babados! (O que será que esse “Rigoletto” recorda ao P.Z.?) Será o momento adequado de notar que, na verdade, o artista só se sente realizado quando a sua obra é reconhecida pelo público: daí que Allen tenha enfatizado a obsessão de Jerry com a sua reforma (a morte artística). Trata-se esta ironia de uma contundente crítica aos pseudo-artistas que insistem em dar a conhecer a sua arte independentemente da sua qualidade, pelo caminho tornando-se sanguessugas de subsídios às artes dados pelo Estado, culpando o público pelo não reconhecimento da sua obra. Com esta breve análise meramente interpretativa do filme de Woody Allen, está concluído um post dedicado aos falsos artistas: até agora, uma falta neste blog. Allen sabia certamente o que fazia, já que ele próprio encenou recentemente o “Gianni Schicchi” da Ópera de Los Angeles (a convite de Plácido Domingo) e falou ao “Corriere della Sera” acerca de encenações de ópera.
Já que se começou com este filme, será interessante referir a parte da história que se reporta a Giancarlo, um italiano perfeitamente normal, mas com uma admirável voz de tenor que se recusa a exibir fora do duche. O papel é representado pelo tenor Fabio Armiliato—um excelente cantor lírico na vida real—criticando a imensidão de vozes que poderiam brilhar se resolvessem mostrar-se. Claro que—não fôsse o filme de Woody Allen—Armiliato acaba por aparecer como Canio na Ópera de Roma… enquanto toma duche! O resto do filme está divido em várias histórias que não têm lugar neste blog, pelo que o leitor está convidado a ver “To Rome With Love” com uma nova perspectiva.
Pagliacci com duche. |
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