Mantendo a tradição seguida nos últimos anos, o Teatro Nacional de São Carlos anunciou a nova temporada em conjunto com o programa do Festival ao Largo, que se desenvolverá ao longo deste mês. Como o nome indica, o Festival ao Largo ocorre no Largo do Teatro de São Carlos e é uma espécie de outlet semi-musical auto-imposto, na medida em que a OPART – empresa pública consistentemente controversa – autoimpõe-se a realização de um festival num espaço inadequado e sem ter uma procura bem definida.
A inadequação do espaço é tão óbvia que poucos reparam nela: não só no sentido logístico, mas também no conceptual. O festival provoca a sobrelotação do Largo, não oferecendo boas condições de conforto à maioria dos espectadores, que frequentemente se vêm empurrados para a rua contígua, cuja fama pelos problemas de esgotos é proporcional à fama do festival. Igualmente proporcionais à fama do festival são a fama do barulho e a insegurança provocados pelo eléctrico 28. A campainha do eléctrico é talvez o mais impertinente barulho possível durante a execução, por exemplo, do intermezzo da Cavelleria Rusticana; e a passagem do transporte ameaça directamente a segurança do público que assiste dessa rua.
Pouco do que se passa neste festival tem de facto um elo com a finalidade histórica do Teatro – a ópera. De facto, dos 15 espectáculos produzidos, apenas 2 serão ópera e 3 serão bailados. Se a inadequação logística do espaço é ignorável por um simbolismo duvidoso, falta responder para que servem os 10 espectáculos que não envolvem o objectivo da organização (ópera em S. Carlos e bailado na Companhia Nacional de Bailado).
Por outras palavras, dois terços do festival são dispendiosos e não prometem retorno do investimento, porquanto o público-alvo não é o mesmo da ópera nem do bailado. Os media não notam este resultado: boa parte do Festival ao Largo constitui uma despesa insustentável que nem sequer tem um público-alvo bem definido, repartindo-se entre transeuntes, amigos do jantar de sábado, hipsters, aborrecidos, madrugadores e, finalmente, uns quantos amigos com lugar marcado. Poucos desses coincidem com o verdadeiro público-alvo do Teatro cujo Largo simbolicamente acolhe este festival.
Felizmente, há sempre três selos que acompanham este festival e ficam muito bem para consumo popular pelos media: “GRÁTIS,” “8.ª EDIÇÃO” e “Joana Carneiro”. No meio da tradicional Embrulhada ao Largo, foi possível programar a nova temporada daquilo que realmente é o objecto histórico de S. Carlos: a ópera. Aí iremos no próximo post, mas não sem antes ponderar sobre este grande evento cuja tardia publicidade é neste momento o supra-sumo dos interesses do Teatro Nacional de São Carlos; não queiramos fazer-lhe sombra focando logo a nova temporada! (E ainda mais se antevemos uma significativa produção wagneriana para os lados de Belém!...)
Então e nenhum comentário sobre a temporada 2016/17? E sobre a prestação de Patrick Diclie? Em 2015 o OPART pagou-lhe 93.100 euros para meros serviços de consultoria para a temporada 15/16 no São Carlos, trabalho esse que vários portugueses - alguns desempregados, como eu - estariam em perfeitas condições de realizar com igual qualidade e por metade do preço. Este ano vamos emho pelo mesmo, erros de casting, cantores principiantes sempre escolhidos entre os "meninos do papá" (aka Brian Dickie) e temporada limitada ao círculo de artistas e encenadores de formação anglo-saxónica. O TNSC agora funciona como rampa de lançamento para as carreiras de jovens aspirantes a cantores vindos da Fundação Bertelsmann? Se é para manter este nível, há muitos cantores portugueses competentes a precisar de trabalho. Parece~me muito má utilização de dinheiros públicos!
ResponderExcluirNão posso comentar a temporada que passou porque não consegui encontrar informações claras sobre quem programou o quê. O programa também foi pouco interessante e o que é certo é que não vou a S. Carlos há mais de um ano. Tenciono acompanhar a nova temporada porque gosto da Carmen, do Tristão, da Ana Bolena, dos Palhaços e tenho alguma curiosidade pelo Peter Grimes. Suponho que o facto de ser uma prodção britânica pode beneficiar o Peter Grimes. Teria todo o gosto em publicar um texto seu, se estiver interessado(a) em discorrer sobre as temporadas presente ou passada neste blog. Claramente, neste momento, não sou qualificado para o fazer. Fica o convite. Cumprimentos
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